Saí para ir fazer qualquer coisa - estudar, estudar - e quando voltei o anúncio ainda lá estava. Claro que achei a situação estranha e comecei a comentar com as pessoas com quem me cruzava. Era o dia da recepção a todos os residentes, pelo que houve uma festa com direito a discurso do director da maison du Portugal e comes e bebes típicos portugueses - pastéis de nata, rissóis, pastéis de bacalhau, queijadas de amêndoa, vinho português, coca-cola light. Durante a festa, perguntei a uma rapariga que mora no quarto ao lado do meu se ela tinha visto os anúncios pregados nas portas dos asiáticos e ela disse que não. Quando lhe contei o que tinha visto, a miúda iniciou verdadeira estratégia de contenção e mudou-se de imediato para o lado da mesa oposto àquele onde estavam os asiáticos, que comiam consolados e abundantemente. Eu também comecei a ficar um bocado preocupado com o assunto, mas estava com tanta fome que nunca cheguei verdadeiramente a sair do pé da comida, não me chateando com o inóculo parasitário que pudesse vir das mãos famintas dos dois rapazes.
Pratos esvaziados em questão de minutos.
Fui embora porque tinha roupa a lavar - lavar a roupa aqui é outra odisseia que nunca demora menos de duas horas, entre esperas, secagens mal feitas e máquinas que não funcionam - e, ao regressar ao quarto, encontrei a Lotti, que queria falar comigo e enquanto esperava à porta se tinha posto à conversa com um dos asiáticos.
'Pedro, são pulgas!'.
E pronto, foi assim que passei a ter cuidado com a porta do meu quarto, que agora é aberta de forma rápida quando alguém bate e fechada imediatamente depois. Os dias foram passando e comecei a aperceber-me de que o problema não tinha sido resolvido porque sempre que chegava a casa a porta do quarto do rapaz que mora à minha frente estava aberta e o interior num caos completo, com ar de não ser habitado e ter sofrido múltiplas desinfestações.
Ontem encontrei-o a mudar-se para o quarto de outro rapaz e perguntei-lhe finalmente o que se passava. Ele explicou-me que o problema se arrastava já há três semanas e que estava farto de acordar com as picadas das pulgas e que por isso estava a mudar-se até terem resolvido o problema. Foi uma conversa reconfortante... ou não.
Hoje cheguei a casa e, no final de uma discussão acesa com o responsável de acolhimento a respeito de uma das máquinas de secar que não funciona como deve ser há um mês e da cozinha do primeiro andar que tem todos os sistemas eléctricos avariados há 7 dias, ele mandou-me um 'vous habitez à la chambre 20, non, Monsieur Melo?' - shit, o homem sabe o meu nome e o meu número de quarto, o que não é bom, porque só me lembro de ter tido discussões com ele sobre coisas como a chave trocada da minha caixa de correio ou a carta registada do banco que ele não tinha que ter assinado, conversas nada polidas. Eu respondi 'oui, c'est moi' e ele, com uma cara torcida como se estivesse obstipado ou com um prazer perverso - não sei explicar - anunciou que amanhã, desde as 14 às 19h, também o meu quarto vai ser desinfestado. 'C'est seulement une mesure préventive', disse-me, e quando lhe perguntei se era preciso guardar alimentos nos armários e arrumar as coisas todas, ele disse que não, mas nunca se sabe, vou jogar pelo seguro e guardar tudo, não vá o
Lancei-lhe facas e vim embora.
Pulgas.
Isso mesmo.
LOOOOOOOOL!
Espectacular!
Mas...pasteis de bacalhau, pasteis de nata e essas iguarias todas não condizem com cocacola light!
;)